Dous
artigos de Fernando Venancio. Filólogo português formado em Amsterdão e
defensor e amante da lingua e a historia da Galiza.Originalidades da língua portuguesa«Se a língua de Afonso Henriques algum
nome pudesse ter tido, era só este: galego». Comunicação do escritor,
crítico literário e professor universitário português Fernando Venâncio, proferida numa sessão solene de embaixadores da CPLPocorrida
em Bruxelas, no dia 15 de maio de 2014 e onde, à volta de «muitas
verdades e alguns mitos» que se contam à volta da língua portuguesa, ele
aborda o que considera um, do «domínio dos mitos folclóricos» e
«recentíssimo»: o que atribui à língua portuguesa a idade de 800 anosexiste o galego portuguêsQue
relação se pode definir na atualidade entre o português e o galego? E
que consequências terá essa relação para a própria maneira de ver a
língua portuguesa?
Muito interessante entrevista na que F. V. sintetiza e explica muito bem , os alicerces da lingua galega e despois portuguesa. Segue a rachar con dor na mente da maioria portuguesa o facto de ser o galego o origem do futuro português, ainda que os dados sejam incontestaveis o jornalista de todo o que di F.V. resume o que verdade qeu a lingua é uma mistura. Pois, engado eu, como qualquer lingua, mas estamos a falar da sua origem e a sua nascença ja como reino portugués que durou muitos anos.
Falar sem atrancos, dizer o que sempre quise-che dizer, deixar-se ir e sacar de ti o grande inteletual e contertúlio. Um prazer escoitar mais duma hora a Alfredo Conde. O autor do "xa vai o Grifón novento" nom se llhe escapa nada.
E eu sem saber. Que grandiosa identidade, a nossa, a dos galegos. Só o povo de Israel podería ter comparança com nós. Meu Deus, dende Prisciliano mantemos pelos vistos a nossa identidade que se manifesta numa colegiada e unánime forma de practicar a escrita. Neste caso tudos escrevemos como continuadores duma guía cultural e espiritual num "continuum histórico", numca visto.
Todos, pelo facto de sermos galegos, escrevemos igual. É obvio, num povo com tanta historia e mantendo dende tão longa data a nossa identidade cultural e nacional , não poderia ser outro o resultado.
Oh, mas que magoa. O reconhecemento da nossa identidade colectiva e quase atemporal é para pôr de manifesto um rasgo negativo da nossa identidade galega. Escrevemos todos igual, por uma misteriosa influência histórica, não obstante fazemô-lo mal. Somos oscuros, com prágrafos longos, moitas subordinadas, sintaxe anárquica, excesivas citas, e tudo por culpa de Prisciliano que também escrevia assim. Que casualidade que o reconhecemnto da nossa identidade histórica, na que concordamos, uma vez mais é aproveitada para acoitelarnos por detrás e afondar no imaginário colectivo negativo a tudo o que sexa identidade galega. Algo assim como, olho galegos, não tenhem nada do que orgulharse da sua historia, e melhor lhes irá se não andam a escavancarem no seu pasado. Assim enchem alguns as suas faltriqueiras de pesimismo, negativismo e auto-odio galaico.
O que escreve, a nota referênciada acima, identifica-se como um galego: " defectos en los que solemos caer los gallegos....". Reconhece, ou vamos a pensar que seja assim, que existe um sustrato comúm de expressão, como qualquer nacão cultural ou identitaria. Embora, não repara, que dende Prisciliano até hoje já passaram tantas coisas, evoluimos tanto, dende a Gallaecia priscilanista até a Galiza de hoje, que haja o que houver, identificarnos, ò povo galego, como um manso rio que seguiu um percurso marcado, sem mudança alguma dende Prisciliano até aquí, bem meresce pelo menos um doctorado "honoris causa". E que pasa cos portugueses, por não falar de Asturias, Astorga, Zamora etc, que daquela formavam parte duma maneira o outra da nossa contorna?. Será que só nos os galegos da Galiza de hoje mantivemos o santo Grial da expressividade colectiva da Gallaecia?.
Ainda que, o que mais chama a minha atenção não é a parvoice de que escrevemos como o fazia Prisciliano, senão ese negativismo e desvalorização do imaginário colectivo que vai cinguido o conceito e a imagem da galeguidade. Se apanhamos qualquer cousinha histórica que mostre que os galegos são tal e qual em senso negativo, então é aceite pela malta cultureta, ninguém vai contrariar. No caso de que quem difunde noticia negativa é um galego , que gosta de flagerlar-se, então o argumento medra em força e fica tudo perfeito. Aliás, reparemos no caso contrario, quando alguém cita, difunde, mostra datos, factos ou opiniões da nossa historia, da nossa maneira de ser, da nossa cultura, das costumes, dal lingua, da cultura e põe em valor tales ditos a reação geral muda o rumo. Xurdem, por toda parte, os contrarios que dende a ironía, o desprecio etc. querem dizernos que tudo é vento sem fondamento, que duvidam das fontes, que as interpretaçãos são ideolóxicas e mixórdias varias todas elas sem rigor co o único objectivo de manter fixe a idea da depreciação de tudo o que cheire a narrar, por em valor ou simplesmente descubrir uma historia, deturpada e oculta. E se isto não fose dabondo, a cousa ainda chega a ser mais miserável quando brotam, como cogumelos, sempre uns tipos de galegos que batem mais forte nese embate contra semesmos. São vixiantes da escuridade para que ninguém quebre a nosso férreo auto-odio e empurram com força, já seja co ceticismo incrédulo, já seja coa retranca que tão bem dominam, para convertirem a mais pequena loubança ou signo de identidade descoberto em positivo numa trapalhada inventada por visionarios inventores da história. Abundam os galegos temerosos do cambio de relato e da pesquisa da autenticidade histórica. São teimudos na sua ignorância ante o medo de que o saber os leve a aparentar uns perigosos revolucionarios que poêm em questão as sacras mitologias que lhe ensinaram.
Reparem por aqui e por ali adiante e escutem e já me dirão se tenho ou não tenho razão.
Seja como for, não pretendo ter a razão, esto é uma anédota curiosa, que nos serviu de escusa para chegarmos um pouco mais longe. Ainda que nos tivessemos que acompanhar da hipérbole expressiva, para fazernos ouvir, o leitmotiv pretendido é que os galegos aprendam, valorizem e narrem a sua história e identidade cultural com orgulho e objectividade. Da mesma forma que sejam muito críticos cos divulgadores negativos, cos olvidadiços, e dos que tenhem como fim fazer de nós um povo invisível na historia. No obstante se o final imos cair , num relato fanático histórico para Galiza e assentâ-lo na mentira, melhor deixemos correr a cousa pois os nossos sucesores terão duplo trabalho para desenmaranhar o novelo de lã que lhe deixamos.
Latim clássico não era certamente. Não só a nossa língua provém do
latim vulgar, das ruas, e não do latim clássico – como seria de
estranhar que o latim, ao longo de mais de 1000 anos, não mudasse. Mudou
– e mudou muito. Entre a chegada dos Romanos ao Ocidente da Península e
o momento em que Afonso Henriques se torna rei, passaram séculos e
séculos – mais séculos, aliás, do que já passaram entre o tempo de
Afonso Henriques e o nosso próprio tempo.
Quando Afonso Henriques nasce, nas ruas já ouvíamos algo com
características que hoje consideraríamos muito portuguesas e muito menos
latinas. Como exemplo, já se notaria a queda do «n» e o «l» em muitas
palavras que, noutras línguas (como o castelhano) ainda se mantêm – por
exemplo, a «luna» latina passou a «lua» no português e manteve-se «luna»
no castelhano.
Apesar de ser já, em traços largos, a nossa língua, ninguém usava a
designação «português» para a língua. O termo comum seria «linguagem», a
linguagem do dia-a-dia, desprezada e sem forma escrita. Era, no
entanto, mesmo sem nome, uma língua completa. As línguas vão mudando ao
longo dos séculos, transformando-se e dividindo-se, mas – na oralidade –
nunca estão numa fase imperfeita ou decadente. Estão sempre em contínua
mudança. (A escrita é outra história…)
Agora, a surpresa: a tal linguagem que saía da boca de Afonso
Henriques desenvolveu-se, a partir do latim vulgar, numa parte do que é
hoje o Norte de Portugal – mas também na Galiza. Naquele momento, não
havia uma fronteira linguística entre o novo reino e o reino a norte. A
língua de Afonso Henriques era a língua latina própria do território da
antiga Galécia romana. Para sermos precisos, a língua desenvolveu-se
numa parte do território da Galécia, que incluía parte daquilo que é
hoje o Norte de Portugal e a Galiza, como explicado no livro Assim Nasceu Uma Língua, de Fernando Venâncio, excelente leitura para quem quiser saber mais sobre a origem da nossa língua.
Por altura da fundação do reino, a tal linguagem da rua, a língua da
Galécia, começou a ser escrita – e há, aliás, muito boa literatura
naquilo que hoje chamamos «galego-português» (um nome que ninguém usou
até muitos séculos depois). A língua própria da antiga Galécia era uma
língua que chegou a ser usada pelos reis castelhanos para escrever
poesia – e foi usada, como aprendemos na escola, por D. Dinis na sua
poesia e, cada vez mais, em documentos oficiais. Era o nosso português
antes de se chamar português.
A língua da Galécia tornou-se a língua do novo reino de Portugal. Com
alguma naturalidade, séculos depois, começou a aparecer o nome de
«português» como designação da língua do reino – sem que a língua
deixasse necessariamente de ser a mesma que se falava ainda a norte do
Minho, na Galiza.
E no Sul? Na altura em que Afonso Henriques se tornou rei de
Portugal, o Sul estava sob domínio muçulmano. A língua da população era,
no entanto, o moçárabe, ou seja, a particular evolução do latim no Sul
da península. Com a expansão do novo reino de Portugal para sul, a
língua do Norte começou a invadir os novos territórios, sofrendo algumas
influências do moçárabe e, através deste, do árabe. A língua da Galiza e
do Norte tornava-se, também, a língua do Sul de Portugal.
Como a capital ficou estabelecida em Lisboa, a forma particular da
língua nessa cidade ganhou um prestígio particular, sem que tal
significasse que fosse, de alguma maneira, a melhor forma de falar a
língua. No Norte, o português continuou a ser falado como sempre foi.
Mesmo na Galiza, onde a língua foi, durante séculos, raramente usada na
escrita, a população continuou a falar, pelos séculos fora, algo muito
próximo do que saía da boca dos portugueses do Norte.
Nas últimas décadas, com a expansão do uso do castelhano na Galiza e
com a uniformização da língua portuguesa centrada nos usos do Sul (uma
uniformização que não é completa, mas tem aproximado a forma de falar
dos portugueses de todo o país), os galegos e os portugueses do Norte
começaram a sentir uma divergência mais marcada naquilo que se fala na
rua a norte e a sul do Minho.
Mesmo assim, ainda hoje há uma surpreendente proximidade entre o que
se fala dum lado e doutro da fronteira entre Portugal e a Galiza – e
note-se que estamos a falar de uma das mais antigas fronteiras do mundo.
Muitos galegos ainda falam galego e nós, claro está, falamos português.
Todos nós, portugueses e galegos, falamos qualquer coisa que descende
da língua que se ouvia em Guimarães – mas também em Tui – quando Afonso
Henriques se tornou o primeiro rei de Portugal.
Essa língua forjada na antiga Galécia está hoje noutras paragens do mundo, já o sabemos. Mas essa história fica para outro dia…
No final deste artigo, deixo algumas sugestões de leitura.
Mas antes, porque esta compulsão para escrever parece não ter
cura, vou tentar explicar aquilo que sei (ou penso saber). Mas tenho de
avisar: não sou linguista histórico. Sou um tradutor e professor que
estuda linguística por motivos práticos e junta a isso uma paixão pela
disciplina.
Pois bem: a verdade é que gosto muito da história da língua — e julgo
ser este um tema que nos interessa a todos. Com base no que fui
aprendendo ao longo dos anos, mas também com base na leitura dos livros e
artigos que refiro no final, aqui fica o meu resumo (os erros, claro,
serão meus e não dos livros e artigos — ressalve-se!).
O português vem do galego?
Enfim: todos nós que dizemos falar português e todos os que dizem
falar galego falamos qualquer coisa que teve origem nos falares da
Galécia, ali no noroeste da Península. Durante séculos, o latim trazido
pelos soldados e colonos romanos e adquirido por toda a população foi
sofrendo transformações — não as podemos ver em tempo real, porque
ninguém as registava ou escrevia, mas, muitos séculos depois, quando
finalmente a língua começou a ser escrita, havia nesse território uma
língua já formada, com verbos próprios, com formas próprias, com
características que a identificam e a distinguem das outras línguas em
redor.
O que chamavam as pessoas a essa língua que já era, em muitos
aspectos, a nossa? Não lhe chamavam nem galego nem português:
chamavam-lhe linguagem, com toda a probabilidade. Era a língua
do povo. Nós, agora, olhando para trás, podemos chamar-lhe «português», o
que não deixa de ser anacrónico, ou «galego», o que não deixa de
assustar algumas almas mais sensíveis, ou «galego-português», para
agradar a gregos e a troianos (como se esses fossem para aqui chamados).
Na escrita, durante todos esses séculos do primeiro milénio, o latim
continuou rei e senhor.
Quando Portugal se tornou independente, começámos a usar a língua que
existia no território, que era ainda apenas o Norte. Não a escolhemos
de imediato, pois nos primeiros tempos o latim ainda foi a língua
oficial. Mas, devagar, a língua que era de facto falada começou a
infiltrar-se nos textos escritos, às vezes de forma imperceptível,
outras vezes de forma mais clara.
O país expandiu-se para sul e, com ele, veio a língua, claro. O
português nasceu nesse canto noroeste e expandiu-se até ao Algarve (e,
mais tarde, até além-mar). Por alturas de D. Dinis era já a língua
oficial.
Depois, no final do século XIV, temos revoluções, a batalha de
Aljubarrota… — a nobreza nortenha perde influência, a burguesia lisboeta
alça-se à posição de classe dominante (e tudo o mais que faz parte da
História). Lisboa é agora a capital e a nação esquece-se que a língua
veio do norte, não foi criada em todo o território nacional. O que se
falava em Lisboa seria esse galego-português que viera para sul com a
Reconquista. Houve, claro, algumas intrusões do moçárabe, a linguagem
latina do sul (com muitos arabismos). Mas, nas suas estruturas e
características principais, a língua que Portugal assumiu como sua é a
língua criada na Galécia: não houve um ponto em que o galego e o
português se tivessem separado claramente.
Influências castelhanas no português literário
Não houve um ponto em que o galego e o português se separassem
claramente. Mas há, isso sim, algum afastamento da língua padrão em
relação ao que se fala mais a norte. Muito desse afastamento fez-se
também por causa das influências externas. Com a corte em Lisboa, e
durante muitos séculos (na época de Camões, por exemplo), o castelhano
teve uma influência que hoje poucos imaginam. Os escritores portugueses
também escreviam, muitos deles, em castelhano. Liam em castelhano. A
igreja usava muito o castelhano. A corte também usava o castelhano. Era a
língua de prestígio. As misturas eram inevitáveis…
Ora, o português popular de todo o país não sofreu estas influências
de forma tão marcada. Assim, arrisco-me a dizer que o português popular
manteve durante mais tempo uma maior grau de semelhança com o galego do
que o português-padrão — talvez por não ter tanta influência castelhana.
Principalmente no Norte, o português e o galego mantiveram-se tão
próximos que a fronteira era difícil de traçar. Mais a sul, na Corte, na
capital, a língua “desgaleguizava-se” (ver artigos de Fernando Venâncio
citados abaixo). Para as elites lisboetas, o galego e o português do
Norte começaram a soar a português da província. E, no entanto, era de
lá que tinha vindo a língua…
Depois, o castelhano deixou de ser uma influência forte no português
(aí por volta do século XVIII); vieram então as influências francesas e,
já bem entrado o século XX, começamos a olhar para o inglês.
Sim, sempre fomos uma língua que sofreu influências fortes de outras
culturas. Podemos não gostar do facto, mas é isso mesmo: um facto. Não
fiquem horrorizados: o castelhano também teve vagas dessas, o francês
idem — então o inglês nem se fala. Não percam muitas horas de sono com
isso — e, depois, a língua vai atrás da cultura, neste ponto: se
quisermos uma língua pura, temos de fechar a cultura a influências
exteriores. As línguas mais puras são as mais isoladas, as menos
importantes.
Para terminar este resumo muito resumido, diga-se que o
português-padrão se expandiu de forma fenomenal durante o século XX, com
a escola, a televisão, a rádio, a imprensa. Aí, as formas do
sul começaram a suplantar as outras formas, que subsistem, mas com menos
força. O português começou a tornar-se mais homogéneo (e menos
nortenho/galego) — mas tudo isto já é história das últimas décadas…
E o galego?
Bem, quanto ao galego, lá em cima, num país sem corte, uma sociedade
rural, não sofreu tanta influência castelhana até muito tarde, embora
essa aparente pureza seja apenas reflexo do isolamento da
sociedade. Grande parte da população galega, aliás, só terá começado a
sentir a invasão da sua língua pelo castelhano quando a escolaridade
obrigatória apareceu no horizonte — e a televisão, jornais, etc. Ou
seja, para muitos galegos, o castelhano tornou-se influência no século
XX (nas elites terá sido antes, claro). Apesar de tardia, a influência
do espanhol é avassaladora, claro está. Aliás, chamar-lhe influência
será um eufemismo cruel. O espanhol não influenciou o galego: o espanhol começou a substituir
o galego. Afinal, o Estado é o espanhol e a escolaridade da população
foi em castelhano até muito tarde. Ou seja, nos séculos XIX e XX,
o galego levou uma coça de que ainda não se levantou, apesar de, desde
os anos 70, o governo autónomo ter, oficialmente, uma política de defesa
da língua.
Alguns galegos tentam aproximar a sua língua do português para assim
melhor se defenderem do peso do castelhano; outros apostam num galego
autónomo tanto do castelhano como do português. Mas que o galego e o
português ainda estão mais próximos do que imaginamos, isso é
indesmentível: então quando começamos a olhar para o vocabulário
popular, aquele que muitos desprezam injustamente, começamos a ver como
falamos uma língua que não deixa de ser muito galega.
Em resumo…
… o português tem origem no latim popular falado no noroeste da
Península, na Galécia Magna, língua essa a que podemos chamar galego por
ser uma língua da zona do Reino da Galiza, uma língua já com
características muito próprias séculos antes da existência de Portugal.
Ao tornar-se a língua dum estado independente a sul, chamado Portugal, a
língua passou a chamar-se português — e com esse nome foi transplantada
para os outros países que a falam. Apesar das mudanças a sul, a língua
mantém uma forte proximidade com o que se fala a norte da fronteira.
Essa língua portuguesa, como é típico duma língua dum país de cultura
aberta a outros povos, sofreu grandes influências exteriores: do
castelhano, do francês, do inglês… Até hoje. Também nos dias de hoje as
formas mais padronizadas do português começam a suplantar as formas mais
populares entre a população em geral — enquanto na Galiza, o castelhano
avança.
Isto é uma explicação simplificada, claro está. É ainda a minha forma
de o explicar: outros dariam ênfases a outras partes ou acrescentariam
pontos talvez importantes… Se alguém quiser corrigir, matizar,
completar, os comentários estão abertos!
(Proponho ainda que dê uma vista de olhos pelas histórias romanceadas
que escrevi e que tentam dar uma ideia do que foi o percurso do idioma
nesses primeiros séculos: «História Secreta da Língua Portuguesa».)
Bem, mas a pergunta era outra: que livros de especialistas podemos ler sobre o assunto?
Proponho dois livros breves, recentes, sobre a História da língua:
Introdução à História do Português, de Ivo Castro (um livro académico e actualizado, com fartos exemplos concretos).
História do Português, de Esperança Cardeira (um livro brevíssimo, editado numa colecção da Caminho sobre temas de linguística).
Proponho também três artigos de Fernando Venâncio sobre o assunto
(convém dizer que as aulas que o autor deu na FCSH, este ano,
permitiram-me aprender muito sobre as origens da língua):
Adenda em Outubro de 2019: os artigos de Fernando Venâncio que referi
acima foram uma amostra das investigações do linguista no que toca à
origem da língua. Em 2019, publicou o livro Assim Nasceu Uma Língua,
um percurso interessantíssimo pelas origens do português. Fica como
sugestão para quem quiser saber mais sobre a pergunta do título.
pois bem — o que dirá o leitor se eu lhe disser que uma das
músicas que será cantada na final da Operação Triunfo espanhola de 2018
inclui estes versos?Meus olhos choram por ver-te meu coraçom por amar-te meus pés por chegar a ti meus braços por abraçar-te. Desejava de te ver, trinta dias cada mês cada semana o seu dia e cada dia umha vez. Tes os olhinhos azuis inda agora reparei se reparara mais cedo nom amava a quem amei.
Isto não é uma tradução. São mesmo os versos que serão
cantados por Sabela, uma das concorrentes finalistas. A canção chama-se
«Tris-tras» e é do grupo Marful. O que se passa aqui? Uma espanhola vai tentar chegar à Eurovisão a cantar em português? As
palavras «coraçom», «umha», «nom» são as pistas para deslindar o
mistério. Sabela é uma concorrente galega e, numa decisão que não é nada
simples em Espanha, decidiu cantar na sua língua: o galego. A
letra acima está escrita na ortografia reintegracionista, muito próxima
da portuguesa. É verdade que o galego oficial usa uma ortografia mais
distante da portuguesa — mas as palavras e as frases são muito nossas. Reparemos,
por exemplo, nos primeiros versos de uma das músicas já cantadas por
Sabela («Benditas Feridas»; note-se — «feridas» e não «heridas»), versos
estes que estão na ortografia oficial, mais distante da portuguesa (e
mesmo assim tão próxima): Pouco a pouco Vou deixando de esperar E secando as miñas ganas de chorar A luz tornouse a miña escuridade