viernes, 18 de octubre de 2019

Fernando Pessoa




“O rosto era comprido e seco. Por detrás de uns pequenos óculos redondos, com lentes grossas, muitas vezes embaciadas, escondiam-se uns olhos castanhos míopes. O seu olhar quando se fixava em alguém era atento e observador, às vezes mesmo misterioso. A boca era muito pequena, de lábios finos, e quase sempre semicerrados. Usava um bigode à americana que lhe conferia um charme especial. Quando falava durante algum tempo e esforçava as cordas vocais, um dos seus pontos sensíveis, o timbre de voz alterava-se, tornando-se mais agudo e um pouco monocórdico. A modulação da passagem de um tom para o outro acabava por reduzir o seu volume vocal natural e o som então emitido ficava mais baixo e um pouco gutural, tornando-se menos audível. 

“Nos últimos dez anos de vida, talvez provocado pelo fumo dos oitenta cigarros diários, adquiriu um pigarrear característico, seguido de uma tosse seca. 
“Embora não muito dado ao riso, Fernando Pessoa tinha uma certa ironia e algum humor, sobretudo se estava bem disposto, o que acontecia algumas vezes quando os amigos mais próximos o desafiavam para jantares. Curiosamente libertava-se então da sua timidez e gesticulava de um modo mecânico e repetitivo, deixando escapar um riso nervoso, às vezes irritante.
“Apesar de conviver com os amigos, no fundo nunca deixou de ser um homem neurasténico, solitário e reservado, pouco dado a conversar com estranhos. No final da sua vida, a melancolia e uma exagerada angústia existencial predominavam. Daí a tendência para se isolar dos mais próximos e dos próprios familiares. O seu temperamento ansioso foi interpretado por alguns dos seus biógrafos como uma personalidade do tipo emotivo não activa. No fundo, era um tímido introvertido, dado a fortes instabilidades de sentimentos e de emoções. 
“Dotado de um carácter bastante complexo, era, apesar de tudo, um homem simples com uma grande inteligência e de uma extrema sensibilidade... era reservado e não gostava falar de si nem dos seus problemas, protegendo o mais possível a sua privacidade. Terrivelmente supersticioso, tinha momentos em que se comportava de uma forma enigmática e misteriosa, a que decerto não seria alheia a sua velha atracção pelo oculto, o esotérico e a própria relação metafísica que tinha com a vida.”

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